Falar português em Timor-Leste
O português faz parte da história da nação timorense. Não a considerar uma língua oficial seria um exagerado risco para o futuro desta nação, pois colocaria em risco a sua identidade. Isto mesmo defende o linguista australiano Geoffrey Hull num livro que o IC acabou de editar, onde explana as suas ideias relativas a um debate que se mantém vivo no seio da sociedade timorense: que língua oficial adoptar?
"O papel central da língua portuguesa na civilização timorense é completamente inquestionável", afirma o linguista Geoffrey Hull no seu recente livro Timor-Leste. Identidade, língua e política educacional editado pelo IC. A língua portuguesa - refere o academista australiano - "por vários factores de ordem histórico-cultural, tem-se mostrado capaz de se harmonizar com as línguas indígenas", questão essencial num território onde existem pelo menos 15 línguas, algumas delas tendo-se ramificado em dialectos locais.
O livro de Geoffrey Hull assume particular interesse numa altura em que se debate na sociedade timorense qual a língua (ou línguas) que terá estatuto oficial. Para Hull a hipótese do português é tanto mais plausível porque "o contacto com Portugal renovou e consolidou a cultura timorense". Aliás, reforça o linguista, quando há 25 anos Timor-Leste emergiu da fase colonial "não foi necessário procurar uma identidade nacional, o país era único do ponto de vista linguistico".
Para o investigador esta situação deve-se à peculiar colonização portuguesa que nunca "interferiu muito com as instituições nativas" fez "poucas tentativas de mudar a cultura indígena". "Os portugueses tiveram sempre como objectivo a assimilação das populações por si conquistadas e acrescentadas ao império". Promoveram em Timor os casamentos mistos, a conversão ao catolicismo não foi forçada, "a maioria dos régulos timorenses aceitou o baptismo" tendo recebido nomes e títulos aristocráticos portugueses. "Em muitos reinos a bandeira portuguesa tornou-se um lúlic, guardado e adorado em casas sagradas", escreve Hull.
Defensor que o tétum, língua franca que, na poligossia timorense, unificou em parte o território, seja também considerado língua oficial, Hull neste seu livro apresenta propostas ao futuro Governo timorense para implementar o seu uso. Há também uma ligação entre o tétum e o português, indo a primeira língua buscar vocábulos à segunda.
A procura de uma língua oficial (ou mais) é fundamental no sentido de fundamentar um identidade nacional que, todavia, Timor-Leste já demonstrou ao mundo quando votou maçivamente pela sua independência (cerca de 80%). Uma "admirável unidade nacional" como enfatiza o autor.
Escrito em tétum e português, o livro de Hull reflecte ainda as consequências negativas da adesão á língua inglesa para a jovem Nação. Se por um lado o inglês se mostra "mais prático" a sua adopção, adverte Hull, traria "graves implicações para o futuro do país". Em seu entender a língua de Shakespeare promove uma processo de "atrofia cultural" visível noutros Estados como a Austrália ou os Estados Unidos onde várias línguas indígenas desapareceram, a que não será alheia a sua "arrogância, geralmente não intencional", mas menos capaz que o português em se harmonizar com as línguas indígenas.
O português é, em si, "um idioma de importante relevo no mundo moderno". Uma língua internacional, falada por cerca de milhões de pessoas nos cinco continentes. Há ainda a importância desempenhada pelas futuras relações de Timor-Leste com o mundo lusófono o que proporcionará vantagens sociais e culturais e benefícios materiais, salienta o autor. "Para Timor-Leste, o português tem também a vantagem de que o tétum (língua franca) não seja formalmente muito afastado do português na sua pronúncia, gramática e vocabulário. O português não é um idioma demasiado difícil para os timorenses pois estes já possuem um relativo conhecimento passivo do português, devido ao facto de que já falam o tetum-Díli", afirma Hull.
Neste sentido, entende o linguista, que "a juventude deve fazer um esforço colectivo para aprender ou reaprender" a língua portuguesa. Um dever que qualifica de "patriótico", até porque a cultura e a língua portuguesas fazem parte da sua memória, e não falar o português seria voltar costas a um passado correndo Timor-Leste o risco de se tornar "uma nação de amnésicos"
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